20.10.10

Entre 'sim' e 'não', o país tem um "Estatuto da Igualdade Racial"


Há anos o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.228/2010) vem sendo discutido e motivo de muitos embates. Em julho deste ano foi sancionado pelo Presidente da República e hoje, entrou legalmente em vigor. Dentre as diretrizes estão 65 artigos que devem atingir cerca de 90 milhões de pessoas, tratando de campos distintos como: saúde, cultura, educação, esporte e lazer, direito à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercício dos cultos religiosos, acesso à terra e à moradia adequada, trabalho e outros.
Antes da sanção o Estatuto gerou uma infinidade de críticas, manifestos contrários e revoltas por conta de mudanças que precisaram ser feitas para que o documento fosse aprovado/sancionado e assim, no final, acabasse por deixar uma parcela satisfeita e outra nem tanto. Não vou aqui comentar de todo minha humilde opinião sobre esse assunto, pois significaria bater de frente com certas posturas não menos justas, mas cujo fim nem sempre justificam os meios. So just!

A grande discussão dentro das modificações girou em torno das cotas. Daí, sob as vértices de sinhá, pode-se refletir: as cotas foram um marco e caminho necessários, mas não devem se 'eternizar'. Na luta por um Brasil mais igual não se pode querer que os filhos dos que são/foram cotistas também entrem na universidade pelo mesmo viés, já visualizando esse caminho como única alternativa; e sim, que venham a competir com igualdade de oportunidades, de condições. Para isso, políticas públicas, ações distintas, focadas devem ser feitas e agilizadas; sem brigas por entidades que querem ter seu quinhão na parte, ou que se sustentem única e exclusivamente atraves de projetos que não prosseguem, logo não concluem o objetivo proposto. A causa é maior!
Não se muda uma herança colonial da noite para o dia e justamente por isso, promover a mudança implica em trabalhos contínuos. Todos tem vez e voz e podem/devem contribuir. Que há divisões, jogos de interesse e muita gente grande envolvida, é fato. Mas se não houvesse, dificilmente se chegaria ao que se tem na atualidade, incluindo uma Secretaria (hoje Ministério). Portanto, sem desmerecer os muitos e grandes nomes do movimento negro e entidades que efetivamente trabalham para que as mudanças acontecam (fora os favoritismos que as imputam 'politicamente', as/os influentes); mas principalmente por eles, vamos carregar essa bandeira e fazer nossa parte!

Sob esse aspecto, é oportuno citar o fato de estarmos na reta final de um período eleitoral, que tem sido muito questionado pelo movimento negro nacional pela omissão por parte de todos os candidatos à presidência, reforçada no segundo turno, para as questões raciais. O Censo 2010 está ai para comprovar o quão negro é o Brasil e quão erroenamente desigual também! Alguns diriam que a omissão é proposital e falar sobre isso implicaria em uma possível complicação quanto à perda de "votinhos básicos", afinal, para muitos ainda não é interessante igualdade - racial, econômica, social e etc. Diriam também que as bases tanto governista quanto oposição - representantes do movimento negro e com acesso direto e indireto -, não estariam interessados num confronto imediato ou poderiam sofrer algumas perdas (pessoais, coletivas...) cujo risco é melhor evitar; e "que se fale de Igualdade Racial quando as eleições passarem".
Estariam os que criticam de todo errado em suas palavras? Sim e não! Mas tenho lá minhas considerações sobre (não é difícil somar 2 + 2...!). O fato é que ninguém fala nem se compromete e as entidades do movimento estão se unindo (na condição de dar apoios) na cobrança de um maior comprometimento em torno dessa questão.


Em mais de um ano de campo, convivendo, aprendendo e observando o cotidiano de uma comunidade negra e suas práticas, posso dizer que nunca as diretrizes do Estatuto fizeram tanto sentido sob alguns pontos. Agora, pra que esse se amplie é preciso que tais diretrizes se efetuem e ai, há toda uma cadeia em volta de ações, pessoas, órgãos, academia e outros num trabalho conjunto.
A continuação da pesquisa, mesmo depois de formada e os muitos momentos de aprendizagem com a sinhá tem sido valiosíssimos para mim enquanto pesquisadora e também agente social nesse processo no qual me inseri; e entre idas e vindas, um consenso: nunca a universidade esteve tão preta e negros tiveram mais e melhor condições e acesso a bens materiais e imateriais também, há um tempo inimagináveis. Não devemos ignorá-los. Claro, não podemos ser utópicos e achar que está tudo resolvido ou se resolverá num passe de mágica com o Estatuto. Nesse 'universo negro' há muitos e muitas e nesse meio, um objetivo 'par' (leia-se: interesse conjunto!). Faltam adequações, posturas mais comprometidas, uma maior abertura para aqueles que de fato produzem; tem-se um longo e árduo caminho pela frente. Porém, um grande avanço foi dado e reconheçamos isso de forma positiva e comemoremos!

Que o Estatuto consiga cumprir seus objetivos (ou pelo menos grande parte dele) e ser um norteador importante na construção de um país mais igual, com condições iguais para todos! Para conhecê-lo na íntegra, basta entrar na página da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR).
Parafraseando um cdx, Hasta!

3 comentários:

algumas palavras disse...

Parafraseando é ótimo. Dona Reis, cdx, peço permissão para afixá-lo no Afro Omnirá..rs, axo q me concentrei mto no tropa de elite 2.."peço permissão"..poderia dizer sem comentários pela lúcida postagem, mas a gestação de letras é intensa, porém não mais constante que a sua, que quero dizer que é um processo diário de "água mole em pedra dura" dizer a diversas, próximas ou não, que há um contexto maior em nossa cultura e sociedade que vai além das cotas, ou seja, as políticas públicas, fugindo da visão crítica de milhões de pessoas vide ótica míope dos sistemas políticos, econômicos e midiáticos que se nutrem do subdesenvolvimento de grande parte da população..stop.. bom..hasta!

Millena disse...

Infelizmente ainda existe o preconceito.

Arte e Design disse...

Belo texto parabéns. Fui criada com a idéia de que todos somos iguais, e toda e qualquer forma de preconceito pra mim é irracional, mas do que leis e estatutos uma mudança de comportamento e educação voltada principalmente para as crianças pode ser um caminho de mais resultados na luta contra o preconceito.


Patricia Melo
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