15.3.10

Quantas chibatas mais precisaremos?!

Depois de não aguentar mais tanto calor, resolvi dar uma pausa nos trabalhos e tomar um belo e demorado (nada ecológico?) banho e nesse interim, começava o primeiro capítulo de Sinhá Moça (novela que gira em torno do período escravocrata brasileiro) que a Globo começa a reprisar. Confesso que a reprise deixou-me queixosa, afinal, inúmeras são as novelas que poderiam ser reprisadas, tendo em vista que essa é muito recente. Antes fosse a original e não o remake, enfim...não é por causa da novela em si, mas da cena que faço esse post.

Trabalho com uma comunidade negra rural ou...como queiram, com uma comunidade remanescente de quilombo e embora não tenha sido um quilombo no sentido literal da palavra, e, segundo alguns estudos, ao redor, tenha tido alguns como vizinho, esse sítio traz em seu espaço físico e também simbólico, traços e heranças marcadamente inseridas no seu 'entorno'. Hoje, (pode-se dizer) caminhando para um processo de transição...e ao ver a cena, tentei figurar sobre o passado através desse sítio, seus fragmentos, seu co
tidiano...

Muito antes de pensar em trabalhar com comunidade negra rural e adentrar nesse universo cuja composição é muito mais extensa do que se imagina, admito que tal causa não detinha minha atenção, nem mesmo meus pensamentos e reflexões sobre os motivos-causas-interesses-etc que nortearam tudo que foi e representou o período escravocrata brasileiro e suas consequências mais de três séculos depois (não, não era uma jovem indiferente, mas não me atinha sobre); e ai, hoje, ao ver aquela cena do Milton Gonçalves como pai José, sendo chicoteado até a morte, e dizendo que ninguém nasce escravo, mas fica escravo, além das lágrimas que sairam espontaneamente e cheias de uma força que não sei explicar (sim, ou sou muito sensível ou então, cada vez mais me convenço de que minhas heranças batem à porta com verocidade!), trouxeram um turbilhão de inquietações e questionamentos, muitos dos quais, no frigi dos ovos, venho respondendo ao longo do meu trabalho.

E é engraçado observar que você vai acumulando muita coisa no decorrer de sua vida em casa, na escola, na academia, nas relações pessoais-sociais e mais que um banco de universidade ou mesmo de uma bela palestra, eu diria que os bastidores te ensinam com um 'q' a mais; e nesses bastidores eu pude ouvir, ver, perceber, aprender e apreender muita coisa. Continuo ouvindo, vendo, percebendo, aprendendo e apreendendo e penso que será sempre assim, mas hoje, posso dizer que minha visão acerca desse 'universo' é muito mais ampla e consciente do que há uns 3, 4 anos e que meu olhar sobre determinadas discussões, determinados moment
os, determinadas falas é muuuuuito mais embasado, embora ponderado que outrora. Se antes não ousava me manifestar sobre, hoje, já não temo, mesmo consciente de que ao meu lado, por exemplo, podem estar raposas velhas que antes de eu pensar em ser projeto de gente, já engatinhavam nesse processo nada fácil e cheio de interesses camuflados. No princípio, uma causa única; no decorrer do tempo, as parcerias que trarão estabilidade mais que resultados; a mesma panelinha, os mesmso discursos. Como diz um querido amigo: "todos querem sua geladeira cheia"....estariam errados? Talvez não. Podem, no fundo, estar respondendo à cobranças do dia-a-dia globalizatório. Claro que tem muita gente boa, responsável, com vontade de fazer diferente...mas sabemos que se trata de um meio onde, infelizmente, os montantes são muitos, as ações nem tanto!

Por que desse texto? Nada de especial...ao ver a cena de um escravo sendo chicoteado at
é não mais aguentar, na senzala de uma fazenda cafeeira, em pleno século XIX (no caso, tudo ficção), além de me emocionar muitíssimo e (tentar)imaginar quão sofredor deve ter sido (se é que há possibilidade de chegar perto de tal coisa!), fez-me correlacionar todo o processo histórico referente a esse período e as consequências hoje na contemporaneidade; e de como cada um de nós tem sua parcela nessa barbárie que continua, numa versão mais atualizada, moderna, é verdade, mas continua. Fez-me voltar ao meu trabalho e refletir sobre como este contribuirá para que naquele sítio, em alguma medida, eu consiga fazer a minha parte, deixar a minha contribuição. Faço o que posso, às vezes mais até. Mas valerá realmente à pena? Alguns momentos vividos durante o trabalho fazem-me crer que sim. Vou seguindo...mas quantos não o fazem, nem mesmo tentam?

Enquanto se discute sobre as falas equivocadas do Lula; a briga do Rio de Janeiro pela detenção dos royalties do petróleo e pra não dividir os louros com os outros Estados; a briga camuflada da oposição x situação (ou Dilma); de uma forma mais discreta, discute-se também a necessidade de políticas públicas voltadas para a questão racial, a forte discussão acerca das cotas e tudo mais. Ainda martelo na Educação como ferramenta-chave para que tenhamos realmente mudanças nas desigualdades, onde, como herança, a maioria pobre, analfabeta, presa e etc é negra Não adianta empurrar um jovem sob condições 'precárias' de vida na universidade sem a mínima condição para isso, pois certamente, muitos não concluirão e uma infinidade de coisas mais. Sem educação, as oportunidades não se configuram; sem educação, as mudanças não se efetivam!

Na realidade, essas 'pequenas observações' valem também para outras esferas, afinal, somos humanos, portanto, imperfeitos e cheios de vaidades (teimo sempre em bater na tecla da vaidade humana e sim, ela tem muito a ver com esse texto), mas não posso falar para as demais e sim para as que eu 'participo (?)', e claro, não me deixa de fora também.
Mas vale pensar sobre!

1 comentários:

Anônimo disse...

q valha,
lembrei da situação em que fazendo-se pesquisa e atuando num dado contexo social assume-se um compromisso, o que nos impede de voltar atrás na escolha, do contrário pode-se correr o risco de ser tachado d aproveitador...senti isso e espero voltar em breve para o grupo q muito me ajudou e poder contribuir de forma mais presente.
Portanto, o compromisso está lançado, não achas!?
hasta!